Às vezes me faltam palavras, 
parece que o ar se esgotou dentro de mim, tornou-se rarefeito
queimou num desses incêndios
que cortam o meu peito
enchendo minha cabeça de fumaça 
e meus olhos de lágrimas.
eu deixo meu fogo interno queimar minha vida,
queimar minha pele,
queimar a vegetação que insiste em crescer no meu coração.
Mas eu queimo calada.

Viver também é estar quieta,
longe dos gritos
perto dos murmúrios
longe da loucura do mundo
perto da loucura de si próprio

A fumaça desses incêndios se transformou em nevoeiro
na minha cabeça
eu não posso ver nada, mas o nada pode me ver
eu procuro a inspiração, tateando
e vou chegando perto dos limites interiores do abismo
lá encontro um vazio profundo
meu vazio
que me olha nos olhos, e pergunta
“Quem, afinal, é você?” 

O pior de tudo é que eu não sei responder.
Quem, afinal, sou eu?
talvez eu seja o nada e o vazio e o abismo
talvez eu seja o nevoeiro e a fumaça e o ar rarefeito
talvez eu seja as próprias palavras que eu já não quero mais dizer
porque falar não leva a nada 

Vou repetir:
porque falar não leva a nada.

Mas se eu me concentrar,
me concentrar mesmo,
eu me aninho nesse vazio
e quando abro os olhos,
eu posso as cores do mundo inteiro,
translúcidas em contato com toda essa névoa.
Talvez eu seja isso,
uma mistura de cores translúcidas.
Dizem translúcido tudo aquilo que deixa passar a luz,
e aqui está a justificativa do meu vazio:
Eu preciso de espaço para deixar a luz passar.

10/09/2023

Incêndios, 
Morgana.